Organização e busca por cuidados em saúde em município rural remoto: uma análise a partir da teoria dos subsistemas de Arthur Kleinman
Municípios brasileiros caracterizados como rurais remotos apresentam contextos territoriais marcados por características geográficas, econômicas, políticas, históricas e culturais específicas que afetam diretamente a vida das pessoas que vivem nessas localidades e o alcance das políticas e serviços públicos, entre os quais os de saúde. Estudos identificam que essas populações enfrentam barreiras adicionais na busca por cuidados em saúde e que, por esta razão, demandam uma compreensão ampliada de como se organizam e se relacionam os sistemas formais e informais envolvidos nos processos de atenção. O objetivo deste trabalho é analisar como se configuram os três subsistemas de cuidados em saúde – informal, profissional e popular – em um município rural remoto da região norte do país. Foi realizado estudo de caso em Assis Brasil, estado do Acre, por meio de entrevistas semiestruturadas com gestores municipais, regionais e estadual; médicos, enfermeiros e agentes comunitários de saúde (ACS) da Estratégia Saúde da Família (ESF); e usuários selecionados a partir de eventos traçadores – pré-natal, parto e puerpério, câncer do colo do útero e hipertensão arterial sistêmica. A análise de conteúdo temática foi guiada pela teoria de Arthur Kleinman segundo a qual em qualquer sociedade complexa podem ser identificados três subsistemas de cuidado à saúde que funcionam de maneira sobreposta e não excludente: o informal (popular sector – família, comunidade, rede de amigos, grupos de apoio e auto-ajuda), o popular (folk sector – agentes especializados seculares ou religiosos, mas não reconhecidos legalmente na sociedade) e o subsistema profissional/formal (professional sector) que se relaciona à disponibilidade e utilização dos serviços formais de saúde. Identificou-se que o subsistema informal desempenha triplo papel na composição dos cuidados em saúde: na perspectiva da solidariedade e empatia; no preenchimento de lacunas das políticas e dos serviços de saúde; e também na complementariedade de ações desenvolvidas pelo sistema formal, o SUS. O sistema popular atuava em complementariedade com o sistema formal, com uso pontual ou longitudinal de seus recursos; e em substituição às práticas formais. O subsistema formal figurou como principal ponto de acesso aos serviços de saúde, em pese várias limitações. Distribuição desigual de estabelecimentos de saúde no território com áreas descobertas; dificuldade de acesso aos serviços devido a condições climáticas e barreiras econômicas para custeio de transporte; alto fluxo de atendimento a estrangeiros e população indígena; promoção de ações de saúde itinerantes na área rural; insuficiência de medicamentos; dificuldades de atração e fixação de profissionais; escassez de recursos tecnológicos e ausência de acesso à internet nas UBS foram alguns resultados encontrados em relação ao subsistema formal. Os resultados mostram que a organização dos serviços e o acesso à saúde apresentam elementos dos três subsistemas, ora complementares, ora substitutivos diante dos constrangimentos ao adequado funcionamento do sistema público. De toda forma, a compreensão ampliada da busca por cuidados em contexto marcado por diversas especificidades, como os territórios rurais remotos, pode contribuir para a oferta de cuidados mas apropriados na perspectiva da atenção à saúde, como também mais culturalmente sensíveis.
Descritores: Saúde da População Rural; Acesso aos Serviços de Saúde; Atenção Primária à Saúde; Municípios Rurais Remotos
Autores |
Karina Vasconcelos Rodrigues Frias
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Países |
Brasil
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Periódico |
Acervo da pesquisa da rede APS MRR
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Idioma |
Português
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Ano |
2021
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Própria |
1
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Tipo |
Dissertação
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