Moradores de áreas rurais representam cerca da metade da população mundial, têm menos acesso a cuidados e apresentam as piores condições de saúde quando comparados com populações urbanas. Na maioria dos países, áreas rurais enfrentam dificuldades com transporte e comunicação, desigualdades de financiamento à saúde, além de escassez e distribuição desigual de profissionais de saúde, com as piores condições de trabalho. Em áreas rurais e remotas, a APS muitas vezes é o único recurso à saúde, por isso seu fortalecimento é a chave para enfrentar as iniquidades nessas áreas. É do que trata o artigo com a participação da pesquisadora da ENSP, Lígia Giovanella, Atenção primária à saúde em áreas rurais: acesso, organização e força de trabalho em saúde em revisão integrativa de literatura.
A APS, como coordenadora da rede de atenção, tem como atributos acesso aos serviços necessários, qualidade do atendimento, precoce e oportuna prevenção e acompanhamento dos problemas de saúde, derivando em abordagem dos problemas em nível familiar e comunitário e competência cultural do cuidado.
No artigo, publicado em Cadernos de Saúde Pública, os autores Cassiano Mendes Franco, Juliana Gagno Lima e Lígia Giovanella afirmam que, o Brasil, não obstante a expansão da APS no território nacional, ainda registra forte desigualdade socioespacial na oferta de serviços, equipamentos e profissionais. “A imprecisão do que é rural contribui para que a dívida de universalidade em saúde para com as áreas rurais permaneça ignorada. A ausência de abordagens mais claras sobre contextos rurais resultou na indefinição de perspectivas de ação nessas áreas, restritas à face agrária, sem expressar a realidade rural contemporânea”.
Segundo eles, a recente revisão da classificação de urbano e rural realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), considerando a densidade demográfica e a acessibilidade a centros urbanos, indicou que 45% dos municípios apresentam baixo grau de urbanização, colocando luz na importância dos espaços rurais no território nacional. Por isso, dizem eles, conhecer as estratégias definidas no debate internacional para a saúde rural pode auxiliar a compreender este tema ainda pouco abordado na realidade brasileira, e insuficientemente incorporado no SUS.
Para os autores, o trabalho colabora com o entendimento dos desafios adicionais da APS na rede regionalizada de atenção à saúde, no contexto rural, e contempla a nítida diversidade de territórios, necessidades de saúde e possíveis caminhos, traçados por experiências internacionais. “Compreender os aspectos particulares das áreas rurais, tanto por suas características de acesso, organização da atenção à saúde e força de trabalho em saúde como por seu processo histórico, social e ambiental em transformação, favorece a criação e o fortalecimento de práticas e políticas públicas renovadas nos princípios fundamentais do SUS, de universalidade, equidade e integralidade, em perspectiva inclusiva do que significa ser rural”.
A pesquisa fez uma revisão integrativa da literatura, com busca de artigos científicos publicados entre 2000 e 2019, nas bases Cochrane e MEDLINE e revistas específicas de saúde rural. A pesquisa resultou em 69 artigos, categorizados em acesso, organização à saúde e força de trabalho. Foram analisados os temas principais de seus achados. Os artigos classificados como acesso apresentaram entre os temas centrais: aspectos geográficos, necessidades de deslocamento dos usuários e acesso aos serviços hospitalares e especializados. Artigos da organização da atenção à saúde trataram de: estrutura e insumos, funcionamento dos serviços de saúde e gestão com base na comunidade. Em força de trabalho em saúde, destacou-se: perfil e papel profissional e fatores de atração/fixação. Ações transversais ao fortalecimento do acesso, organização à saúde e força de trabalho em saúde em áreas rurais foram: atuação comunitária, modelos de extensão/visitação, tecnologias de comunicação/informação, acesso à assistência e formação/desenvolvimento profissional.
Por fim, o artigo aponta que formas de garantir acesso integral à saúde próprias para as áreas rurais são, portanto, a possibilidade de subverter modelos estabelecidos. “Áreas rurais podem trazer perspectivas mais adequadas de APS, frente à sua diversidade e aos desafios que impõem à lógica comum. Em suma, podem inverter o cone de visão, trazendo a essência da unicidade para o sistema mais geral”, conclui.
Por Informe ENSP. Acesse a noticia original aqui
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