Artigo analisa processo de trabalho dos agentes comunitários de saúde na Amazônia

Foto: Prefeitura de Manaus

Em todo o mundo, populações rurais dispõem de menor oferta, utilização e acesso a serviços de saúde e apresentam os piores indicadores de saúde, quando comparadas às populações urbanas. Na região amazônica brasileira, desafios estruturais e políticos para a implantação de políticas públicas de saúde são intensificados frente à diversidade regional: áreas de cheia e vazante dos rios, alta dispersão populacional, precárias condições de trafegabilidade, presença de populações tradicionais com necessidades específicas, como indígenas, ribeirinhas e quilombolas. Para as autoras do artigo, sendo da ENSP, Juliana Gagno Lima, Lígia Giovanella e Márcia Cristina Rodrigues Fausto, o conjunto ampliado de práticas dos agentes sugere ser este um relevante ator para promover cuidados, facilitar acesso da população à rede de atenção à saúde e um elo real entre populações rurais e serviços de saúde em municípios rurais remotos.


Segundo o artigo O processo de trabalho dos agentes comunitários de saúde: contribuições para o cuidado em territórios rurais remotos na Amazônia, de autoria de Juliana Gagno Lima, Lígia Giovanella, Márcia Cristina Rodrigues Fausto, e Patty Fidelis de Almeida, no Brasil, a criação de um programa nacional de ACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS) data de 1991, ainda que experiências isoladas anteriores ao SUS ocorressem nos estados do Paraná, Mato Grosso do Sul, Ceará, dentre outros. O PACS, inicialmente implantado em municípios de baixa densidade populacional, com características de seletividade e ênfase em cuidados infantis, orientações sobre hidratação oral, vacinação e desnutrição foi a partir de 1994 integrado de forma gradual e transitória ao Programa Saúde da Família (PSF).


Elas dizem que normativas sobre o trabalho dos ACS fortaleceram a sua atuação no SUS, principalmente na prevenção de doenças, promoção da saúde e identificação de necessidades da população e do território, por meio da visita domiciliar, não obstante, inúmeros desafios permaneceram para a qualificação de seu trabalho em áreas urbanas de elevada concentração populacional.


O artigo lembra que questionamentos sobre a existência do ACS e suas atribuições foram intensificados, a partir de 2016, e expressos na revisão da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), em 2017, que permite a redução do número de ACS nas equipe ESF e a ausência de ACS nas equipes de atenção básica, agora equiparadas às equipes ESF, com impactos que podem ser ainda mais severos em territórios rurais remotos.


Quanto aos resultados, o artigo relata que os municípios rurais remotos estudados têm população entre 12 mil e 40 mil habitantes, baixo produto interno bruto (PIB) per capita e baixa arrecadação tributária, salvo um que recebia royalties de usina hidrelétrica. As populações tinham baixa renda, com número expressivo de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família e escassas fontes de renda (prefeitura, comércio, pesca artesanal, produção de farinha ou agricultura familiar de subsistência).


As pesquisadoras também relatam que as condições de saneamento básico são precárias em todos os municípios, com situação agravada no interior. “Na sede, o abastecimento de água é feito por microssistemas com distribuição por poços artesianos e caixas d’água para o armazenamento sem tratamento, sendo frequente no interior, o consumo de água do rio. Uma iniciativa diferenciada foi o Sistema Salta Z (solução alternativa coletiva simplificada de tratamento de água para consumo humano), instalado em um dos municípios pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Inexistia esgotamento sanitário e era precária a coleta de lixo”.


E, ainda: os municípios tinham forte presença de população rural (53% a 80%), com baixa densidade demográfica, povoação muito esparsa e grande número de pequenas comunidades/vilas no território. As populações tradicionais mais comuns eram ribeirinhas – pescadores artesanais ou extrativistas – e indígenas, presentes principalmente no interior, que vivem às margens de rios na Amazônia brasileira, com seus modos de vida consonantes com a dinâmica das águas (cheias e vazantes) e acesso exclusivo fluvial.


Também observam que a atenção à saúde nos municípios rurais remotos estudados era prestada exclusivamente pelo SUS, em UBS, postos de saúde, unidades mistas ou pequenos hospitais (presentes nos cinco casos). Todos os municípios implementaram equipes ESF, com cobertura entre 56% e 100%. Em quatro municípios havia equipes de Estratégia de Agentes Comunitários de Saúde (EACS) em territórios rurais. Em geral, havia apenas uma equipe por UBS. As UBS da sede contavam com equipes ESF, o que nem sempre era possível no interior.


O ACS é um profissional de saúde singular com atribuições gerais na prevenção, promoção e proteção à saúde, e com um papel de mediação social como agente político no território. Na análise do estudo, identificaram-se componentes do processo de trabalho dos ACS que indicam um escopo ampliado de práticas em municípios rurais remotos, como acompanhamento familiar, cuidados e medidas preventivas individuais, abordagem coletiva/comunitária e atividades administrativas, tendo como atividade principal as visita domiciliar, além de aspectos da qualificação do seu trabalho.


As autoras alertam que é necessário retirar o ACS rural do lugar de uma atuação substitutiva e de cuidado isolado para valorizá-lo com base em iniciativas de qualificação, apoio e integração à equipe, de forma a ampliar as oportunidades de acesso e de consolidação do direito à saúde. “Nesse sentido, são necessárias políticas que reconheçam as especificidades dos territórios e “modelem” o cuidado ofertado em função da realidade dos municípios rurais remotos amazônicos”, concluem.

Por Informe ENSP. Acesse a noticia original aqui

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